Em reunião extraordinária realizada na tarde desta terça-feira (30/7), o Conselho Municipal de Saúde do Rio de Janeiro (CMS-RJ) aprovou resolução contrária à municipalização do Hospital Federal do Andaraí (HFA). Realizada no auditório do Conselho Distrital de Saúde da Área Programática (AP) 2.2, na Tijuca, a sessão do CMS-RJ teve a presença do secretário municipal de saúde do Rio, Daniel Soranz, e foi marcada por grandes tensionamentos entre o gestor, conselheiros e servidores da rede federal em greve. Convidados a participar da reunião desta terça-feira (30/7), o Departamento de Gestão Hospitalar (DGH) e o Ministério Público Federal não enviaram representantes.
Após a abertura oficial da sessão, feita por Osvaldo Sergio Mendes, presidente do CMS-RJ, o secretário Daniel Soranz foi o primeiro a falar. Em tom arrogante e desrespeitoso para com os conselheiros e servidores presentes, Soranz tentou justificar a municipalização do Hospital do Andaraí com o argumento falacioso de que a rede federal “está encolhendo” e que, portanto, já “não teria mais capacidade de oferecer atendimento de qualidade à população”. Como exemplos, citou obras paradas, como a da Emergência do Andaraí, a judicialização da obra da radioterapia, o uso do andar do Centro de Tratamento de Queimados (CTQ) como depósito e a falta de recursos humanos no hospital. Sobre este problema da falta de RH, o secretário informou que a RioSaúde vai contratar mil novos trabalhadores para atuarem no Hospital do Andaraí. Neste momento, Soranz foi interrompido por servidores da rede federal, que lembraram o fato de os trabalhadores da RioSaúde estarem em greve. Os servidores também lembraram as péssimas condições da rede municipal de saúde do Rio, onde um paciente morreu após a queda do elevador do Hospital Salgado Filho (Méier).
Visivelmente irritado com a interrupção e as críticas feitas pelos servidores, Soranz tentou responsabilizar a greve da rede federal pelos problemas da saúde. “O que vejo aqui é um movimento de catimba e deboche, mas pouco trabalho”, disse o secretário, numa declaração sem qualquer fundamento na realidade concreta.
Em resposta, a servidora Aline Cavalini, do Hospital do Andaraí, rebateu as ofensas proferidas pelo secretário: “Infelizmente, o Ministério da Saúde deixou as unidades federais sucateadas e por isto é que sofremos um desabastecimento proposital. Lutamos para que a assistência à população seja de qualidade. O que garante que a prefeitura não vai deixar faltar insumos, se as unidades sob responsabilidade dela, como UPAS e clínicas da família, não funcionam? A prefeitura não dá conta sequer das unidades municipais. A nossa greve é um direito do trabalhador que exercemos plenamente”, disse ela, para constrangimento de Daniel Soranz.
Em seguida, o conselheiro Abílio Tozini pediu a palavra para manifestar seu repúdio à municipalização. “Não podemos abrir mão de manter o Hospital do Andaraí como uma unidade federal e de alta complexidade. Uma unidade onde os servidores sejam concursados e estatutários. Na rede municipal a prefeitura está fechando as portas aos servidores públicos. Isto mostra que o município do Rio não tem capacidade de assumir os hospitais federais”, disse ele.
Dirigente do Sindsprev/RJ, Maria Celina de Oliveira reforçou as preocupações. “Já tivemos uma experiência anterior de municipalização, e não foi satisfatória. Após ser municipalizado, o Hospital da Piedade transformou-se numa unidade sem referência. O mesmo aconteceu com o Hospital de Jacarepaguá, que era referência em tuberculose. Além de todos os problemas decorrentes da municipalização, existe outro muito grave. Para onde vão os servidores federais? Qual será o perfil de um Hospital do Andaraí municipalizado? Atualmente, com todo o sucateamento, o Andaraí ainda é referência no tratamento de queimados”, frisou ela.
Presidente da Comissão de Saúde da Câmara Municipal do Rio, o vereador Paulo Pinheiro (PSOL-RJ) criticou a postura do Ministério da Saúde. “É lamentável que o Ministério da Saúde não queira ouvir os trabalhadores da rede. A ministra Nísia só os recebeu após uma manifestação que eles fizeram durante um evento do G-20. Nísia esqueceu que é ministra. Para ela, aquilo que o Ministério está fazendo no momento faz parte do SUS. Ela também disse que o Ministério não existe para administrar hospitais. O Ministério da Saúde está cometendo uma das maiores traições à população do Rio de Janeiro”, disse.
Pouco antes da votação do CMS-RJ, Soranz fez uma segunda e última fala. Em tom arrogante, disse que, nos hospitais municipais do Rio, “não há trabalhadores precarizados”, no que foi imediatamente desmentido pelos servidores presentes à sessão do Conselho. Segundo os trabalhadores, o PIS dos contratados pela rede municipal não está sendo pago. Visivelmente irritado e contrariado, o secretário encerrou sua lamentável fala. Em seguida, deixou a sessão do CMS-RJ.
No próximo dia 16 de agosto, a partir das 14h, acontecerá a reunião da Comissão de Fiscalização dos Hospitais Federais organizada pelo CMS-RJ. Na ocasião será apresentado o relatório das visitas técnicas feitas pelo Conselho às unidades federais do Rio.
A principal motivação para a reunião extraordinária do CMS-RJ ocorrida nesta terça-feira (30) foi o fato de a ministra Nísia Trindade (Saúde) ter procedido unilateralmente à municipalização do Hospital Federal do Andaraí, o que está em total desacordo com os princípios do controle social estabelecidos no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Assinada por Nísia, a Portaria nº 4.847 — que transfere a gestão do Hospital Federal do Andaraí ao município do Rio de Janeiro — não prevê qualquer consulta aos conselhos federal, estadual e municipal de saúde do Rio.