Uma projeção do governo federal aponta que cerca de 57 mil servidores do Executivo Federal podem se aposentar até 2026. E mais. A previsão é que, nos próximos dez anos, cerca de 181 mil servidores se aposentem. Este ano, 24 mil servidores públicos do Executivo Federal estão aptos a se aposentar. Essa estimativa deve ser menor até 2031, porém, em 2034, deve haver novo pico com 20 mil prováveis saídas da administração pública. Entre 2010 e 2023, quase 246 mil servidores do Executivo Federal encerraram sua carreira no setor público.
Muitos servidores, com idade de se aposentar, optam por continuar no serviço público, adiando a aposentadoria. Dados do Painel Estatístico de Pessoal (PEP) do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI) apontam que há por volta de 66,3 mil servidores ativos em abono de permanência. Do total de servidores nessa condição, 53,4% (35.428) eram homens e 46,6% (30.869) eram mulheres.
Segundo dados da Revista Gestão de Pessoas em Evidência (RGPE), elaborada pelo observatório de Pessoal da Administração Pública Federal, da Secretaria de Gestão de Pessoas (SGP) do MGI, em 2024, 48% dos servidores com idade de se aposentar e que continuaram a trabalhar estavam em 20 cargos. O líder da lista é o de Professor do Magistério Superior, com 6.960 servidores, seguido pelo cargo de Professor do Ensino Básico/Tecnológico (3.334) e pelo de Técnico do Seguro Social (2.508).
Maria Ivone Suppo, diretora do Sindsprev/RJ, chamou a atenção para o colapso que pode ocorrer no atendimento do INSS a curto prazo. Segundo ela, a população está ameaçada de ficar desassistida.
“Se não forem tomadas providências imediatas, será gerado um grande buraco no serviço público. O usuário do SUS e da Previdência, que paga pelo déficit de servidor e pela falta de concurso público, sofrerá com isso. Imagina a situação do servidor que quiser continuar no trabalho. Terá que se transformar em quantas pessoas para cobrir o espaço deixado pelo colega que está saindo?”, comentou.
A diretora do Sindsprev/RJ lembrou que, para fazer concurso, o governo deve ver o déficit nas diversas carreiras que tem dentro do serviço público.
“Não adianta fazer concurso a toque de caixa só para dizer que fez concurso público. Tem que fazer um levantamento nas diversas carreiras para ver a real necessidade. Quando for concurso para a Previdência Social tem que verificar o número de técnicos, analistas. Não é um concurso público para dizer que fez”, recomendou.
Maria Ivone Suppo criticou ainda o grande número de estagiários nas agências da Previdência.
“São vários estagiários e poucos ou nenhum servidor concursado para atender ou orientar o cidadão. Isso acontece também na saúde. Faz um concurso na saúde e não vê o déficit de médicos dentro das suas especialidades. Qual o déficit de médicos, de nutricionistas. Não é concurso público por concurso público. É concurso em cima de um estudo e isso tem que ser para ontem. Com real número de vagas e não um fictício como o governo vem fazendo. Tapa buraco com prestador, tapa buraco com contrato temporário”, criticou.
A servidora acredita que o governo poderá organizar um concurso público em pouco tempo.
“Se o governo tem esse levantamento de 57 mil de servidores que vão se aposentar, ele já sabe que vai ter um déficit em diversos setores do serviço público de categorias que precisam ser alocadas. Quantos médicos são necessários, quantos neurologistas, dermatologistas, urologistas. Temos um grande buraco na rede. Na saúde federal: nefrologistas, urologistas, neurologistas são especialidades que se aposentaram e não foram cobertas. Hoje são cobertos por temporário. É o famoso puxadinho dentro do concurso público. O Ministério Público exigiu. Não basta abrir o concurso. Vai suprir as necessidades?”, indagou.
Sebastião Souza, também dirigente do Sindsprev/RJ, lembrou que, dos 57 mil servidores previstos para se aposentar, nem todos querem sair. Segundo o dirigente, a maioria quer sair devido às péssimas condições de serviço.
“Hoje é muito desgastante ser servidor em todas as áreas. Não estou me referindo só à área de saúde. Estou falando também da educação, segurança federal. Minha maior decepção como cidadão brasileiro é que nesses quatro governos do PT não houve uma política mais séria de Recursos Humanos. Há 10 anos, foi realizada uma assembleia em Niterói onde se falou do sucateamento da saúde de forma perversa. Hoje, a situação não mudou. Quando se fala em sucateamento não é só da estrutura. É sucateamento do RH. Porque não adianta ter um hospital montado e não ter um RH”, comentou.
O dirigente aponta a falta de concurso público e a desvalorização profissional como um dos principais motivos para a falta de servidores.
“Não tem concurso e não há valorização profissional para quem é servidor. Muitos profissionais qualificados saíram. Desses 57 mil, tenho certeza que 12 mil estão saindo pela péssima condição de trabalho e por salário abaixo do mercado. O servidor fez doutorado, mestrado, e queria implementar no SUS aquilo que aprendeu, mas não tem condições para isso. Você chega no hospital e encontra laboratório mal conservado. Pede exame e não tem estrutura”, lamentou.
Sebastião Souza lembrou de Niterói, onde três mil pacientes aguardam na fila para exame de colonoscopia.
“É um exame que nos países mais adiantados o paciente com 40 anos tem incluído na sua rotina, no check up anual. Por que três mil aguardam na fila? Por falta de recurso humano, por falta de um especialista. Endoscopia e colonoscopia são exames fundamentais para fazer qualquer levantamento de câncer. Dessas pessoas que estão na fila com certeza 10%, 300 pessoas, estão com câncer. E não vai dar tempo para a cirurgia. Quando abrir não terá mais o que fazer”, lamentou.
O dirigente também lembrou de dois aparelhos novos para exame de colonoscopia que chegaram ao Hospital Carlos Tortelly, antigo CPN, em Niterói, mas não são usados por falta de profissionais.
“E com três mil pessoas na fila. Isso vai acarretar custo para o INSS. Muitos pacientes vão entrar no INSS daqui a pouco porque estarão com a doença em estado grave. Vai ficar sequelado. Minha preocupação é até onde o governo vai com essa política. No Rio de Janeiro, o sucateamento está em curso há 18 anos. O último concurso foi em 2005. Já se foram 20 anos. O governo não quer e não tem uma política de estado para a saúde nem para a educação. Foi o que o saudoso Brizola e o Darcy Ribeiro tentaram fazer. Darcy e Brizola tentaram construir uma política de estado. A política de estado é a constituição. Você não pode sair daquela linha. A gente fica vendo um ser humano encurtando o seu tempo de vida pela falha do governo. Por que dinheiro tem. Nosso orçamento é de 4 bilhões. Teria como fazer bons concursos e contratar com bom salário. Para reverter tem que ter concurso público, incentivo ao servidor. Tem que querer e ter vontade política”, concluiu.
Servidor do INSS e dirigente do Sindsprev/RJ, Carlos Vinicius Lopes também manifestou preocupação com a falta de recursos humanos após a aposentadoria de milhares de trabalhadores do serviço público. “Esta aposentadoria de mais de 57 mil servidores até 2026 vai provocar um colapso ainda maior no INSS, onde o déficit de trabalhadores já é muito grande. Eu tenho denunciado a desestruturação e o desmantelamento da autarquia em decorrência da falta de concurso, e o pior é que a administração pública sabe disto, como também sabe que hoje já é impossível cumprir qualquer meta devido à carência de servidores e às precárias condições de trabalho nas agências e gerências do instituto”, afirmou ele.