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quinta-feira, novembro 21, 2024
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Mídia não tem interesse em mostrar a ligação entre o corte de verbas e o caos na saúde pública

O caos da rede pública de saúde é causado pelos cortes de verbas feitos pelos governos federal, dos estados e municípios, em função de uma política que restringe cada vez mais os investimentos e entrega porções cada vez maiores do orçamento público a interesses privados. A mídia brasileira sabe desta relação, mas pouco se refere a este fato porque não há interesse em ligar as decisões políticas com suas consequências para o setor público, que precisa ser sempre mostrado como algo caótico e pesado para a população, que sofre com a falta de condições de atendimento. “Na essência é uma escolha editorial” das empresas. A avaliação é de Henrique Acker (foto), jornalista da ASSIBGE – Sindicato Nacional, do Programa Boca Livre e editor do Blog do Acker. Além da cobertura dos principais temas políticos e econômicos, Henrique Acker é especialista na análise da cobertura jornalística feita pela mídia nacional.

Sindsprev/RJ – A mídia brasileira tem feito a cobertura jornalística da pandemia do novo coronavírus, falando das dificuldades que constata nas unidades da rede pública hospitalar, sem, no entanto, se aprofundar nas causas que levaram a esta situação. O que falta registrar, em relação a este aspecto?

Henrique Acker – A mídia empresarial é mais um ramo concentrado da economia brasileira, como todos os outros. As Organizações Globo são um oligopólio com diversos tentáculos e sobrevivem de uma relação de simbiose com o Estado e chantagem com os governos. Ou seja, a Globo vende comunicação e quer sempre um terreno tranquilo para ver prosperar seus negócios. O caos da rede pública de saúde é conhecido do povo brasileiro, sobretudo dos mais pobres, que não têm como ter plano de saúde. Não há novidade nisso. Ele é causado pelos cortes de orçamentos da saúde dos governos federal, estaduais e municipais, em função de uma política que restringe cada vez mais os investimentos públicos e entrega porções cada vez maiores do orçamento público a interesses privados. A contrapartida é que o SUS, mesmo numa situação caótica, sem pessoal, sem equipamentos e sem estrutura, é o único sistema de saúde capaz de atender a grande massa dos doentes.

Sindsprev/RJ – Você acha que esta omissão é proposital ou uma falha na cobertura?

Henrique – As duas coisas. É uma falha profissional, porque todo fato tem uma explicação também factual, ou seja, os hospitais, postos e UPA estão sucateados e sem pessoal por conta de decisões políticas dos governantes, que podem ser demonstradas. Portanto, do ponto de vista jornalístico, há aí um erro crasso. Mas na essência é uma escolha editorial, porque não há interesse em ligar as decisões políticas com suas consequências para o setor público, que precisa ser sempre mostrado como algo caótico e pesado para a população, que sofre essas consequências na dificuldade de um atendimento, um exame, uma internação ou uma cirurgia.

Sindsprev/RJ – O ajuste fiscal de Bolsonaro e do ministro da Economia, Paulo Guedes – que ampliou o de Michel Temer e o iniciado no fim do governo Dilma Roussef –, é o verdadeiro vilão da ausência total de condições de atendimento à população, principalmente com a pandemia. Mas a mídia também omite este fato.

Por quê?

Henrique – A Rede Globo e os demais grupos empresariais de mídia no Brasil não fazem jornalismo, eles tomam posição a favor dos seus interesses de classe. Interessa mostrar o caos na saúde pública, para sempre apresentar a estrutura do Estado como vilão, cujos gastos precisam ser enxugados. Ou seja, não é o ajuste fiscal, promovido pelo governo Bolsonaro e a esmagadora maioria dos governos estaduais e municipais, o responsável por este caos.

E o pior é que isso não é sequer debatido para que se reflita sobre as razões que levam as unidades de saúde do SUS a esta situação. O debate a este respeito é interditado.

Sindsprev/RJ – Agora mesmo, a imprensa vem tratando como coisa normal a disposição do governo Bolsonaro e dos partidos de sua base parlamentar de congelar por 18 meses o salário de todos os servidores públicos. Seria, segundo alegação oficial, uma economia para destinar recursos aos estados e municípios de modo a combater a pandemia. As fontes de informação são sempre gente do governo e os presidentes da Câmara e do Senado. Pouco se ouvem partidos de oposição ou centrais sindicais. Como você analisa este fato e a omissão de que há recursos suficientes para este fim, até porque o governo não teve dificuldades para doar R$ 1,2 trilhão ao sistema financeiro para ‘enfrentar a pandemia’?

Henrique – Desde os marajás, do tempo do Collor, a mídia trata o funcionalismo público como um setor “privilegiado” da população. De tal maneira que boa parte do funcionalismo acabou incorporando essa pecha e a maioria do povo, muito pobre, acaba enxergando o servidor público como um vilão, um adversário. No entanto, os maiores gastos públicos do governo federal estão concentrados no pagamento de juros/amortizações da dívida pública todos os anos, ou seja, dinheiro que deixa de ser investido no setor público para enriquecer banqueiros e credores do país, que agem como agiotas da Nação. Outro dia mesmo vi uma entrevista do presidente do Banco Santander na CNN, e as entrevistadoras sequer perguntaram a ele o destino dessa doação de R$1,2 trilhão, em plena pandemia de covid19.

Sindsprev/RJ – Como você avalia o comportamento da mídia na cobertura do caso da saída de Sérgio Moro do Ministério da Justiça e as revelações de interferência política do presidente da República nas investigações da Polícia Federal?

Henrique – Sérgio Moro e Paulo Guedes são os queridinhos da Rede Globo e fiadores do mercado financeiro no governo Bolsonaro. Um, como reserva moral do pensamento conservador de direita no Judiciário, e o outro, como executor de uma política econômica de reformas neoliberais e privatizações, dois pontos essenciais para o grande capital. Sérgio Moro foi tratado como um injustiçado, que não sabia de nada. No entanto, que medidas o senhor Moro tomou neste quase um ano e meio de governo, diante de tantos casos escabrosos envolvendo o próprio presidente, assessores e ministros?

A começar pelo envolvimento evidente dos filhos do presidente diretamente com grupos de milicianos. O caso parece muito óbvio e seria para a abertura imediata de uma investigação e pedido de impedimento de Bolsonaro.

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