Nesta quarta-feira (24/4) os profissionais da rede federal de saúde deram início a uma paralisação de 48 horas. O objetivo é impedir o plano do governo Lula de desmembrar e privatizar os hospitais federais do Rio de Janeiro. Depois de sair em passeata da Sala Cecília Meireles, às 11h22, chegaram ao prédio do Departamento de Gestão Hospitalar (DGH), na Rua México, 128, às 11h40, onde participaram de um protesto, ocupando, às 12h25, o hall do DGH onde permanecerão acampados até a noite desta quinta-feira (25/4).
A ideia do governo é acabar com o trabalho articulado das unidades da rede, dividindo-a em fatias entregando cada uma para um gestor diferente, que pode ser o governo do estado, a Prefeitura do Rio de Janeiro, a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh) e até mesmo grupos privados de saúde, como é o caso do hospital Nossa Senhora da Conceição, do Rio Grande do Sul, que já teria assumindo a gestão do Hospital Federal de Bonsucesso (HFB). O plano foi concebido pelo ministro da Casa Civil Rui Costa, em reunião no dia 9 de abril, em Brasília, com as ministras Nísia Trindade, da Saúde, e Esther Dweck, da Gestão e Inovação (MGI).
Na verdade, a ideia de Rui Costa é privatizar a saúde federal, como ocorreu com a rede estadual e a rede municipal entregues a grupos privados travestidos de organizações sociais, gerando um caos ainda maior para a população. “O que precisamos nos hospitais federais é de verba orçamentária que foi ainda mais reduzida neste governo. Precisamos de concurso público para acabar com o déficit de pessoal de mais de 12 mil servidores e de valorização. Foram estas promessas feitas pelo candidato Lula e não cumpridas até agora. Pior: agora querem destruir os hospitais federais passando para as OS que como todos sabem estão invariavelmente envolvidas em escândalos de desvio de dinheiro, sobretudo para campanhas eleitorais”, afirmou Christiane Gerardo, diretora do Sindsprev/RJ, durante a passeata.
Audiência com Nísia
A pressão das mobilizações da saúde federal já começou a surtir efeito. A ministra Nísia Trindade, marcou uma audiência com o Sindsprev/RJ e o Sindicato dos Enfermeiros (SindEnf) para esta sexta-feira, à tarde. A finalidade é encontrar saídas para a crise criada pelo ministério nos hospitais. O Sindsprev/RJ tem outra reunião marcada, esta, para a próxima segunda-feira (29/4), com a Defensoria Púbica da União (DPU).
“Já vimos esta história antes em outros governos. Começam cortando a verba, causando desabastecimento, equipamentos sem manutenção, não realizando concurso público para depois poder anunciar a privatização, estadualização e municipalização como solução para uma situação causada pelo próprio governo”, denunciou a dirigente.
Lula ignora controle social
Líbia Bellusci, diretora do SindEnf ressaltou que a paralisação e a ocupação fazem parte da luta dos profissionais de saúde em defesa da rede. “O ministério da saúde provocou esta situação e culpou os servidores. Cortou ainda mais a verbas do setor e agora quer fatiá-lo e entregá-lo a diferentes tipos de gestores para então entregar as unidades e seus bilhões de reais para enriquecer grupos privados. Não vamos admitir que isto seja feito”, avisou a dirigente.
Christiane lembrou que a antiga gestão do DGH, a cargo do médico Alexandre Telles, a quem chamou de ‘aloprados’, fez um levantamento da rede colocando sobre os ombros dos servidores a responsabilidade pelo caos causado pelo ministério e pelo DGH. “Para resolver o problema, além de investimento, é preciso democratizar a gestão, ouvindo os servidores e os usuários, numa gestão com a participação do controle social, como prevê o Sistema Único de Saúde (SUS), que são os conselhos distritais, municipais e do estado. Um governo que se diz de esquerda tem que ouvir os servidores e a população, para decidir junto com os setores envolvidos o melhor para os hospitais”, disse.
Helvécio é gestor de hospital
Segundo apurou o jornalista Sidney Rezende, em sua coluna, publicada no dia 23 de abril, o grupo Nossa Senhora da Conceição, que passaria a gerir o Hospital Federal de Bonsucesso, teria como membro do Conselho Gestor simplesmente o ex-chefe da secretaria de Atenção Especializada à Saúde, subordinado à Nísia Trindade. Além do óbvio conflito de interesse, a transação jamais poderia ser feita, já que Helvécio foi exonerado por Nísia por incompetência, após denúncias do Sindsprev/RJ e matéria do Fantástico mostrando o caos na saúde federal.
Antes, em 13 de abril, o plano de fatiamento da rede federal foi objeto de matéria da jornalista Berenice Seara. O Sindsprev/RJ conversou, na semana passado, com um assessor do Ministério da Saúde que confirmou todas as informações contidas no texto de Seara.
A matéria informa que o novo modelo de administração já estava sendo desenhado pela equipe de Costa.” Há unidades que vão virar fundações; outras, empresas públicas — e há a previsão de entrada, no Rio, do Grupo Hospitalar Conceição, vinculado ao Ministério da Saúde e com atuação no Rio Grande do Sul. Um hospital deve passar para o estado; outro, para o município. A Fiocruz continuará com o que já tem e deve ganhar mais. O Instituto Nacional do Câncer (Inca), o maior do Rio, com quatro unidades, deve passar a ser gerido por Parceria Público-Privada (PPP)”, informava a jornalista.
Diz mais: “O prefeito Eduardo Paes (PSD) está reticente, mas, se o presidente Lula pedir muito, o município do Rio vai passar a administrar o Cardoso Fontes, também conhecido como Hospital Geral de Jacarepaguá”. Acrescenta que o Hospital do Andaraí passaria para a UniRio — escolhido pela proximidade com o Gaffrée e Guinle, hospital-escola da universidade.
Obras só com privatização
Na reunião, foi decidido que a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), vinculada ao Ministério da Educação, ficará responsável pelo Hospital Clementino Fraga Filho, da UFRJ, que ocupa parte de um esqueleto inacabado na Ilha do Fundão. Pelo projeto, a empresa pública vai gerenciar uma grande reforma a ser feita no prédio. Ela também vai assumir a Maternidade-Escola de Laranjeiras, outra unidade da UFRJ.
A Fundação Oswaldo Cruz mantém o Instituto Fernandes Figueira e o Instituto de Pesquisas Clínicas Evandro Chagas (Ipec). Mas vai ficar também com o Hospital da Lagoa — que o hoje líder do PP na Câmara dos Deputados e ex-secretário estadual de Saúde, Doutor Luizinho, queria transformar no Instituto Estadual do Câncer. O ministério nunca respondeu.
Talvez a única unidade que fique sob a administração direta do Ministério da Saúde seja o Hospital de Ipanema, que um dia já foi especializado em cirurgias.
“Nesta rede de 22 unidades (21 só na capital)”, o texto se refere também aos hospitais universitários, “existem de 30 a 40 obras paradas. As mais importantes são a construção do novo Inca; a implantação do Hospital do Cérebro no Servidores do Estado; a reforma do outrora famosíssimo Centro de Tratamento de Queimados (CTQ) do Andaraí; a reforma da subestação elétrica do Hospital de Bonsucesso; e, claro, a conclusão (e agora, também a recuperação) do Hospital esqueleto Clementino Fraga Filho”, diz o texto.
Cada obra seria concluída segundo um modelo diferente de gestão, que ainda estão sendo estabelecidos pela equipe do ministro Rui Costa. Mas teriam que estar concluídas até dezembro de 2025 — segundo o prazo estabelecido com mão de ferro pelo presidente Lula.