Realizada na última segunda-feira (20/7), a reunião extraordinária da Comissão de Saúde e Bem-Estar Social da Câmara de Niterói debateu formas de combater a exploração e a precarização do trabalho dos entregadores de aplicativos — que exercem suas funções usando motocicletas ou bicicletas — durante a pandemia de coronavírus no município. Coordenado pelo vereador Paulo Eduardo Gomes (PSOL), que também preside a Comissão, o evento teve a participação do procurador federal do trabalho (MPT Niterói), Maurício Guimarães de Carvalho; do presidente da Associação Fluminense dos Advogados Trabalhistas (AFAT), Cesar Dória; do diretor jurídico da Associação da Saúde de Niterói, advogado José Ricardo Lessa; e do representante dos entregadores de aplicativos, Rafael Simões.
A Comissão de Saúde e Bem-Estar Social da Câmara de Niterói está muito preocupada com a crescente precariedade dos profissionais que trabalham como entregadores de aplicativos e do comércio em geral. Precariedade marcada pela total falta ou insuficiência de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), jornadas de trabalho ilimitadas, ausência de direitos trabalhistas ou de qualquer outra proteção social.
“A necessidade de discutirmos o assunto também tem o objetivo de sabermos quais os limites para uma ação de âmbito local contra essa precarização do trabalho em Niterói. Existe uma lei municipal de proteção aos mototaxistas, mas a lei até hoje não saiu do papel porque não foi regulamentada. Também existe a Lei estadual nº 5.679, de 31 de março de 2010, que obriga as empresas a providenciarem seguro de vida para cada entregador, cobrindo despesas médicas. Queremos que esses direitos sejam respeitados”, afirmou, na abertura da reunião, o vereador Paulo Eduardo Gomes.
Representando os entregadores, Rafael Simões fez um relato da dura realidade enfrentada pela categoria. “Durante a pandemia do coronavírus, não paramos um momento sequer de realizar o nosso trabalho, levando alimentos e medicamentos à população. A questão é que as empresas de aplicativo nos impõem cada vez mais trabalho, e tudo sob condições muito precárias. Os acidentes com entregadores continuam ocorrendo, mas não recebemos nenhum auxílio quando nos acidentamos. Estamos passando momentos de muita dificuldade, mas acredito que podemos reverter esse quadro”, disse.
O advogado da Associação dos Servidores da Saúde de Niterói, José Ricardo Lessa, frisou a necessidade de os trabalhadores se organizarem e se mobilizarem para não somente conquistarem leis de proteção social e trabalhista, mas para também fazerem valer a legislação. “O caso dos agentes comunitários de saúde [ACS] é um dos maiores exemplos do quanto é fundamental para os trabalhadores continuarem mobilizados. Em 2006, a categoria conquistou a Lei 11.350, que prevê a regulamentação profissional. Mesmo assim, e já passados 14 anos, ainda existem vários municípios que não cumprem essa lei. Ter uma lei é importante, mas tão importante quanto isto é os trabalhadores se organizarem, transformando-se no elemento indutor do cumprimento dos seus direitos. Isto também vale para os entregadores”, destacou.
Membro do Centro de Referência em Saúde do Trabalhador (CEREST) de Niterói, o médico Ricardo Garcia, que também assistiu à reunião, reforçou as críticas à precarização das condições de trabalho dos entregadores. “Eles são trabalhadores que praticamente não têm nenhum equipamento de proteção. Eles mesmos é que têm de comprar esses equipamentos, que não são fornecidos pelas empresas. Quando se acidentam, não têm seguro algum que os proteja. O pior é que eles estão no olho do furacão para contaminação da covid”, afirmou.
Ricardo Garcia destacou que todos os que trabalham e moram em Niterói podem procurar o CEREST em busca de atendimento e orientações. O CEREST funciona na Av. Amaral Peixoto, 169 – 8º andar. O telefone é 2717-7238. No momento, em função da pandemia da covid, o atendimento presencial está com algumas restrições, mas os contatos também podem ser feitos pelo e-mail da instituição: cerestrj2@gmail.com
Como reflexo dessa precariedade e da superexploração a que são submetidos, no dia 1º de julho deste ano milhares de entregadores das empresas de aplicativos fizeram um dia nacional de paralisações e protestos. Com a mobilização, a categoria cobrou de empresas como Rappi, iFood, Loggi, Uber Eats, 99Food e James direitos básicos sonegados.
Além de Niterói, houve mobilizações e protestos no Distrito Federal e em cidades como Aracaju (SE), Belo Horizonte (MG), Campinas (SP), São Paulo (SP), Piracicaba (SP), Fortaleza (CE), Recife (PE), Rio de Janeiro (RJ), Salvador (BA), Teresina (PI), Maceió (AL) e Goiânia (GO).
Em maio deste ano, entregadores de Niterói já haviam protestado, em frente à estação das barcas, na Praça Araribóia, contra suas precárias condições de trabalho e a superexploração imposta pelas empresas de aplicativo. Na época, a manifestação reuniu cerca de 200 profissionais.