A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Genocídio decidiu criar um núcleo voltado exclusivamente à investigação de atos irregulares e omissões do governo Bolsonaro que aprofundaram o caos nos hospitais federais localizados no estado do Rio de Janeiro, levando à morte de milhares de pessoas pela covid-19. Foram determinantes para a decisão as denúncias documentadas e pedidos de investigação feitos tanto à CPI quanto ao Ministério Público e Poder Judiciário pelo Sindsprev/RJ e também pela Federação Nacional (Fenasps), além da mobilização sistemática dos servidores da rede federal, com assembleias e protestos, muitas vezes, tendo que enfrentar a truculência da Polícia Militar.
Além das fraudes, com superfaturamento de contratos de obras desnecessárias e desvio de verbas que deveriam estar sendo investidas no combate à pandemia, o negacionismo fez com que o governo se recusasse a realizar concurso para cobrir o gigantesco déficit de pessoal e, pior, dispensasse 4.117 profissionais, aprofundando o caos nos hospitais federais. Além disto, há fortes indícios de fraude na seleção simplificada para a contratação de pouco mais de 1 mil novos profissionais por seis meses.
Todos estes fatos aconteceram na gestão do general Eduardo Pazuello à frente do Ministério da Saúde e do coronel George Divério, no comando da Superintendência Estadual do MS.
Ambos estariam ligados ao senador Flávio Bolsonaro (Patriotas-RJ), de quem a CPI suspeita de participação nas irregularidades e na indicação de gestores das unidades federais.
Ataque ao Sindsprev/RJ
A diretora da Regional Jacarepaguá do Sindsprev/REJ, Christiane Gerardo, ressaltou que, por organizar a luta categoria, o Sindsprev/RJ vem sendo duramente atacado por Bolsonaro. “O governo vem impondo uma multa de R$ 1,2 milhão por descumprimento de uma decisão judicial referente a uma greve no Instituto Nacional do Câncer (Inca), em 2014. Foi uma greve vitoriosa que possibilitou a manutenção das 30 horas para toda a categoria”, frisou. Acrescentou que os servidores decidiram apoiar o sindicato, seja através de uma forte campanha de sindicalização, seja articulando com parlamentares a elaboração de um projeto de decreto legislativo dando anistia à entidade.
Ampla investigação
O diretor do Sindsprev/RJ Sidney Castro lembrou que todas as irregularidades do Ministério da Saúde no Rio de Janeiro vêm sendo denunciadas pelo Sindicato. Acrescentou esperar ver tudo investigado a fundo pela CPI. “A crise nos hospitais federais vem desde 2016, ano em que deixaram de ser realizados concursos, agravando a falta crônica de pessoal, que foi aprofundada pelo negacionismo do governo Bolsonaro. Além de não promover concurso, negando a gravidade da pandemia, ainda se recusou a renovar mais de 4 mil contratos temporários, desacatando, inclusive, ordem judicial e levando à dispensa deste quantitativo de profissionais, deixando a população refém da covid-19”, acusou.
Outra grave irregularidade a ser investigada e apontados os responsáveis é a seleção simplificada de pouco mais de 1.400 novos profissionais em caráter temporário para as unidades federais. “A CPI tem que se debruçar sobre este caso que é, no mínimo, estranho. Seriam escolhidos aqueles com melhor qualificação, tempo de trabalho e experiência. Mas ficaram de fora 70% dos contratados temporariamente e que estavam entre 10 e 15 anos na rede federal. De outro lado, entraram pessoas sem qualquer qualificação, sendo que os primeiros teriam pontos a mais pela experiência”, relatou Sidney.
“Rapina da caserna”
Para Christiane Gerardo, a criação de um núcleo da CPI especificamente para investigar irregularidades na gestão do Ministério da Saúde do Rio de Janeiro é uma conquista da categoria. “É uma vitória dos militantes do Sindsprev/RJ, que vêm cotidianamente instrumentalizando, encaminhando aos senadores da CPI e auxiliando a imprensa sobre as irregularidades que envolvem a poderosa e agora abandonada rede federal”, afirmou. Acrescentou que devem ser investigados, ainda, os responsáveis pelas demissões em massa.
Christiane disse ser necessário aprofundar as investigações sobre empresas de construção contratadas pela Superintendência do Ministério da Saúde, sobretudo a Plano Construções e Instalações Ltda, que atua no Hospital Cardoso Fontes. As investigações feitas pela atual diretora da unidade, Ana Paula Fernandes da Silva, fizeram com que ela passasse a ser ameaçada de afastamento do cargo.
“Sabemos que a rapina da caserna se instalou na gestão do ministério sobre a rede federal do Rio de Janeiro, e esta rapina precisa ser investigada e desmantelada”, afirmou a dirigente, que defendeu ainda a necessidade de serem aprofundas as investigações sobre convênios irregulares com fundações, como a Fosep.
Segundo ela, têm de ser investigados, também, contratos suspeitos para reformar prédios administrativos durante a pandemia, contratados na gestão do coronel da George Divério, exonerado do cargo de Superintendente do Ministério da Saúde no Rio. Em novembro, Divério autorizou duas contratações sem licitação que somavam quase R$ 30 milhões, por empresa de pequeno porte.