O voto complementar do parecer da reforma da Previdência, lido pelo deputado Samuel Moreira (PSDB-SP) ao final da tarde da terça-feira (2), reintroduz a possibilidade de União, Estados e municípios instituírem alíquotas previdenciárias extraordinárias para servidores públicos – ativos e aposentados – pagarem. Na prática, a reinserção do item abre caminho para que governantes reduzam as remunerações de servidores públicos quando supostos déficits no regime próprio de Previdência forem observados. A medida também atingiria pensionistas.
O relator leu o voto complementar de cinco páginas ao final da tarde, após recursos apresentados por parlamentares da Oposição para que isso fosse adiado serem derrubados. Como o próprio deputado havia dito, o complemento ao parecer não traz alterações que mudem significativamente o voto inicial e tampouco o perfil da reforma enviada pelo presidente Jair Bolsonaro. “A proposta do governo é socialmente irresponsável, porque vai sacrificar a vida dos que mais trabalham e que menos ganham”, disse o deputado federal Alexandre Molon (PSB-RJ), falando como líder da Oposição, pouco antes de Samuel Moreira iniciar a leitura do voto.
Servidores públicos
Em relação ao funcionalismo, além da reincluir a previsão de possíveis taxações extras, o relator manteve a idade mínima para a aposentadoria dentro das regras constitucionais – no voto inicial isso era transferido para a legislação complementar. No entanto, a idade fixada segue de 62 anos para mulheres e 65 para homens. Também não houve novas mudanças, a partir de uma análise inicial, nas regras de transição para os servidores públicos – com exceção de professores do ensino básico e de policiais estaduais. As regras de transição para os servidores são consideradas muito duras pelos sindicatos da categoria.
Análise do Dieese (Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Sócio-Econômicos) aponta que a maioria dos servidores nem sequer vão se encaixar nos critérios de transição e vão acabar submetidos aos novos parâmetros gerais para a aposentadoria. Estados e municípios seguem parcialmente fora da reforma e este é um dos pontos que mais ‘mobiliza’ o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).
Outro aspecto que gerou muita disputa e divisão dentro da própria base do governo é a questão dos policiais. A categoria luta para ficar de fora das regras mais duras da reforma – como a fixação da idade mínima. Realizaram ato específico do setor em Brasília, no qual Bolsonaro chegou a ser chamado de ‘traidor’. Mais de um terço da bancada do PSL – o partido do presidente da República – pretende apresentar destaques sobre esse ponto para livrar os profissionais da segurança das regras gerais.
Votação
A leitura do relatório e a sessão terminaram sem que fosse possível afirmar quando o relatório será votado. O governo e as lideranças parlamentares pró-reforma têm pressa – o raciocínio é que quanto mais a tramitação se estender, mais difícil pode ficar aprovar a emenda constitucional, que necessita que 308 dos 513 deputados votem a favor no Plenário para passar pela Câmara e ir ao Senado.
O deputado federal Marcelo Ramos (PL-AM), presidente da comissão especial, disse que o início da votação da proposta dependerá de conversa com as lideranças das bancadas partidárias. “Pra votar, tem que ter voto. Não dá pra votar sem ter a segurança da garantia de votos para a aprovação da matéria. Então, enquanto houver questionamentos de um ou outro partido, a gente precisa ter segurança, responsabilidade com o futuro do país”, disse a jornalistas.
Nas declarações que têm dado, Rodrigo Maia, por sua vez, diz atuar para que a proposta seja aprovada na comissão esta semana e, assim, haja tempo para votá-la ao menos em primeiro turno no Plenário da Câmara, antes do recesso parlamentar, que começa no dia 18 de julho.
Mobilização
Os movimentos contrários à reforma trabalham para que isso fique para o segundo semestre. Buscam ganhar tempo para construir as condições para que a reforma seja rejeitada. Avaliam que o que está em curso é a tentativa de aprovar o desmonte da Previdência pública, transferir recursos do fundo público para o setor privado e abrir caminho para uma maior mercantilização e exploração do setor pelo sistema financeiro. Uma manifestação unificada, puxada por entidades sindicais e estudantis da educação, está sendo convocada para Brasília para o dia 12 de julho. As centrais sindicais endossaram a proposta e também estão convocando o ato, assim como manifestações nos estados.
Portas fechadas
A sessão em que se deu a leitura do relatório transcorreu de portas fechadas e basicamente sem a presença de público externo na sala. Trabalhadores que se encontravam na Câmara, representando entidades sindicais e organizações da sociedade civil, criticaram a restrição ao acesso e a tentativa de isolar os deputados para acelerar a aprovação de uma reforma que, afirmam, é injusta e inviabilizará o direito à aposentadoria de milhões de trabalhadores e trabalhadoras no Brasil. Ao longo da semana, servidores que integram a delegação do Sindsprev-RJ que está em Brasília participaram das atividades de contato com parlamentares e defenderam o direito à aposentadoria.