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domingo, novembro 24, 2024
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Desvalorização do real impacta negativamente o Brasil, diz economista

A desvalorização do real, estimulada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, tem efeitos negativos sobre o país. Não impacta positivamente as exportações e pode causar alta da inflação devido à indexação de muitos preços ao dólar, como medicamentos, tarifas – como as de eletricidade e telefonia – e dos derivados de petróleo. A avaliação é do economista Adhemar Mineiro (foto), ex-técnico do Dieese, para quem a desvalorização não atrai investidores estrangeiros que, ao contrário, estão saindo do Brasil e de outros países considerados de alto risco, devido a sua instabilidade política, causada, no nosso caso, pelo governo Bolsonaro, quando ataca questões vistas como importantes no cenário internacional, como direitos sociais e ambientais.

Adhemar apontou a estagnação da economia brasileira como outro complicador. O PIB de 2019 deve ficar em torno de 1%. Adhemar aponta, também, o crescimento do déficit de transações correntes como mais um elemento de fragilidade. Este dado é visto como muito perigoso no cenário internacional. “Este é outro elemento que tem que se tomar cuidado. Os especuladores internacionais são meio como tubarões: se sentirem o cheiro do sangue, sentirem essa fragilidade internacional do país, eles atacam com um movimento especulativo, e o Brasil está cada vez mais sujeito a coisas deste tipo conforme as suas fragilidades vão aumentando”, alertou.

Quais as consequências da desvalorização do real frente ao dólar? O ministro Paulo Guedes tem repetido que o dólar alto é bom para o país.

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É isso mesmo?

Adhemar Mineiro – O valor alto ou baixo do dólar reflete uma estratégia de desenvolvimento do país. Um dólar mais alto, no caso, um real mais baixo deveria facilitar as exportações, especialmente na área de bens industriais, onde há uma maior concorrência internacional. Na área de commodities não faz muito efeito. Só que o Brasil é um grande exportador de commodities. Na área industrial o Brasil vem perdendo mercados, apesar da desvalorização do real, por conta, por exemplo, de uma política protecionista, aplicada em vários países, especialmente pelos Estados Unidos, que recentemente, apesar de todas as concessões que o governo Bolsonaro tem feito, do ponto de vista das relações diplomática e de comércio, tirou o Brasil do Sistema Geral de Preferências, que institui vantagens de acesso ao mercado dos EUA, passando a considerar o Brasil, assim como Índia, China, Indonésia, Argentina, entre outros, como países já desenvolvidos ou a caminho de se tornarem desenvolvidos, e que, assim, não precisariam de vantagens para acessar o mercado norte-americano. Na verdade é uma defesa, principalmente na área de produtos siderúrgicos que entram mais baratos nos EUA, que tentam se proteger. Então, do ponto de vista do comércio, a desvalorização do real tem muito pouco efeito.

E para o restante da economia?

Adhemar – Desde o Plano Real, que foi tirando os mecanismos de indexação, o dólar acabou virando o grande elemento de indexação da economia brasileira. Então, cada vez que o real se desvaloriza frente ao dólar, vários preços, sejam de importados, sejam de produtos ou serviços de alguma forma indexados ao dólar, acabam subindo de preço, como medicamentos, tarifas de energia, derivados de petróleo, Não é à toa que em consequência da estagnação da economia, ano passado, o governo esperava uma inflação abaixo da meta e acabou acima, refletindo principalmente a subida dos preços indexados ao dólar nos meses de novembro e dezembro. E com essa corrida do dólar em janeiro e inicio de fevereiro é possível um impacto no crescimento da inflação, principalmente dos produtos indexados ao dólar. Exatamente por isto o Banco Central interveio para tentar segurar o valor do dólar internamente.

Quem se beneficia com a desvalorização do real?

Beneficia quem tem receitas em dólar. Basicamente os exportadores e os setores financeiros, que têm acesso a dólar fácil e barato no exterior, e as empresas multinacionais, que têm suas receitas, seus ativos no exterior em dólar e em outras moedas fortes como o euro, que também está subindo e, a partir daí, ganham na sua atuação no Brasil. Os setores mais prejudicados são os que operam em moeda nacional, mas que têm que comprar, ou acessar, produtos em dólar ou com preço indexado ao dólar.

Há outros fatores para a alta do dólar?

É importante dizer também que a subida do dólar vem acontecendo em todo o mundo, não só no Brasil, onde este movimento tem sido mais agudo, e reflete uma conjuntura internacional bem desfavorável, uma aversão dos investidores internacionais ao risco, buscando sair de situações complicadas. E a América Latina, especialmente o Brasil, é vista como uma situação muito complicada. Tem acontecido uma saída de capitais, inclusive de investidores estrangeiros das bolsas de valores.

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Os acontecimentos internacionais não são favoráveis, com incertezas relacionadas ao que vai acontecer com a economia chinesa, com o coronavírus e a saída da Inglaterra da União Europeia. Há também um processo eleitoral com muita instabilidade nos EUA, país em que o presidente, por si só, já é um elemento de instabilidade permanente com suas declarações. A situação internacional não é favorável e o Brasil se encontra numa situação ainda mais complicada porque é visto como um país de risco, com um governo, para dizer o mínimo, instável, do ponto de vista político e de como se comporta, colocando em risco questões vistas como importantes no cenário internacional, como direitos sociais e direitos ambientais.

O Brasil é visto como um país em situação de risco…

É importante dizer que o déficit em transações correntes do Brasil cresceu muito em um ano e meio, e esse é um indicador importante da fragilidade comercial de um país. Este déficit saiu de zero e está em 3%. Um déficit próximo de 4% é visto como muito perigoso no cenário internacional. Este é outro elemento que tem que se tomar cuidado. Os especuladores internacionais são meio como tubarões: se sentirem o cheiro do sangue, sentirem essa fragilidade internacional do país, eles atacam com um movimento especulativo, e o Brasil está cada vez mais sujeito a coisas deste tipo conforme as suas fragilidades vão aumentando.

O governo vem repetindo que a economia vai se recuperar e a mídia reverbera esta afirmação. Mas o que vai acontecer de fato no país com este atual modelo econômico?

Vemos um fato que se repete todo o final de ano, há uns três anos, com as “pitonizas” do mercado financeiro virando o ano dizendo que “agora vai”, que “a economia vai se recuperar”, que vai ‘deslanchar’ porque está sendo feito um ajuste fiscal, fazendo as reformas e que, finalmente, o país vai ter uma taxa de crescimento de 2% a 3%. E depois vai se ajustando os indicadores de crescimento do Produto Interno Bruto e sai essa previsão otimista para o retorno da quase estagnação – uma taxa de crescimento em torno de 1%. Indicadores do BC apontam que o crescimento do ano passado talvez tenha sido até menor do que 1%. O índice capta as avaliações do mercado: a indústria reverteu o crescimento, o comércio caiu, houve desaceleração nos índices de serviços, e o setor agrícola puxa muito pouco o restante da economia, por ser pequeno.

E há alguma saída para esta situação?

Isso tudo mostra que a reversão desta situação, com a retomada de uma taxa de crescimento mais vigorosa, depende de fazer crescer a demanda aqui dentro. E no momento em que se tem os empresários olhando este quadro e muito avessos a fazer investimentos; a renda das pessoas caindo; com o pouco crescimento no mercado de trabalho sendo reflexo do crescimento da informalidade, o que não alavanca crédito, por exemplo; o único elemento dinâmico que se teria seria aumentar o gasto público, e o governo vem se recusando a fazer isto, há três anos, e há três anos a gente vem colhendo o resultado desta recusa com estagnação da economia. Retomar o investimento público daria fôlego para os empresários aumentarem o investimento, aumentaria o emprego e o consumo das famílias.

A desvalorização facilita as privatizações ao depreciar o patrimônio dessas empresas, estimado em reais?

A desvalorização do real torna os ativos no Brasil mais baratos. Quem tem moedas internacionais se valorizando frente à brasileira olha para estes preços que vêm caindo. Isto deveria ser um incentivo à compra das estatais. Só que, pelo cenário internacional avesso a risco, acaba que esses recursos não entram. Vimos isto acontecer nos leilões de imensas áreas de petróleo. Apesar de todo o incentivo que o governo tentou dar à entrada de empresas internacionais, a Petrobras acabou levando todas as áreas leiloadas.

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Os únicos investidores que mostraram algum interesse, aparentemente, depois de negociações políticas, foram as estatais chinesas. De um lado tem-se o barateamento das empresas públicas brasileiras pela desvalorização do real frente ao dólar. Mas de outro lado você tem uma enorme aversão ao risco. É muito difícil que venham investimentos grandes de fora, particularmente para um país como o Brasil, que é visto como uma ameaça ao meio ambiente mundial, a questões que estão mais que estabelecidas em relação aos direitos humanos a nível internacional. Nenhum investidor quer comprometer a imagem da sua empresa, do seu fundo de investimentos, com um país visto como muito complicado. A menos que o governo entregue essas empresas praticamente de graça, dê créditos através do BNDES, como já ameaça fazer na área de saneamento, em que se pensa em dar crédito para as empresas nacionais e estrangeiras para que elas operassem. Aí nestes moldes, de graça, poderia ser que algum grupo se interessasse. Agora, entrar, de fato, capital internacional nesse processo é muito difícil.

Da Redação do Sindsprev/RJ
Por Olyntho Contente

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