Reunido na tarde desta terça-feira (27/8), no 10º andar da Rua México, 128, no Centro da Cidade, o Conselho Estadual de Saúde do Rio de Janeiro (CES/RJ) rejeitou a implantação do projeto do governo Lula de entregar o Hospital do Andaraí à Prefeitura do Rio de Janeiro. A reunião contou com a presença de representantes do Ministério da Saúde e também rejeitou a municipalização de qualquer outra unidade federal, já que também estaria prevista a passagem do Cardoso Fontes para as mãos do município. O presidente do Conselho Estadual, Leonardo Legora, dirigiu a mesa que organizou os debates.
A proposta de rejeição foi feita pelo ex-membro do Conselho Nacional de Saúde, Francisco Júnior, e apresentada como proposta alternativa à do governo. Para o conselheiro, o projeto faz parte de um longo processo de desconstrução do Sistema Único de Saúde, iniciado pelo ministro da Administração, Bresser Pereira, ainda no governo Fernando Henrique Cardoso. “Trata-se da mesma política do Estado mínimo, de terceirização e privatização do SUS. O SUS tem que ser público, com regras únicas, gestores servidores de carreira, com contratações de profissionais pelo Regime Jurídico Único e não pela CLT, como seria através da Prefeitura ou da Ebserh, o que poderia transformar o que é público em cabide de empregos”, afirmou.
Vitória do SUS – A resolução do plenário do Conselho Estadual confirma a decisão do Conselho Municipal de Saúde, aprovada em 30 de julho, que também rejeitou o projeto do governo de municipalização. Todos os representantes dos usuários e servidores do SUS que discursaram criticaram o governo Lula e a ministra da Saúde, Nísia Trindade, em particular, por terem imposto – unilateralmente e sem consulta aos conselhos, que formam o chamado controle social – não só a municipalização dos hospitais do Andaraí e Cardoso Fontes, como o fatiamento das seis unidades da rede federal, e sua entrega a diferentes gestores, entre eles o grupo hospitalar Nossa Senhora da Conceição, a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh) e a Fundação Oswaldo Cruz.
Comando de Greve – Integrantes do Comando de Greve dos Servidores da Saúde – a categoria está em greve contra o fatiamento desde 15 de maio – comemoraram a decisão e cobraram em suas falas a obrigação do Ministério da Saúde de respeitar as decisões do controle social do SUS, cancelando o processo de municipalização e fatiamento em curso. Maria Isabel, do Comando de Greve, denunciou que a ampliação da crise nos hospitais federais é de responsabilidade do governo federal.
“Recebemos todos os dias pacientes graves vindos da rede municipal do Rio que por falta de atendimento chegam com quadro muito grave. E vem aqui estes senhores do Ministério da Saúde dizer que para melhorar a rede federal tem que passar para a gestão da Prefeitura? É muita cara-de-pau”, criticou Maria Isabel.
A servidora acrescentou que há uma crise crescente de desabastecimento nos hospitais federais provocada pelo Ministério da Saúde através do corte orçamentário para justificar o fatiamento. “Pessoas estão morrendo por falta de medicamentos, exames e todo o tipo de insumo, e somos nós que enfrentamos essa dura realidade tentando de todas as formas salvar vidas. O que vai resolver esta situação é a volta dos recursos públicos aos hospitais federais e a realização de concurso para cobrir o enorme déficit de pessoal. O problema não é de gestão, mas de falta de financiamento”, argumentou.
Também do Comando de Greve, Roberta Santiago lembrou que mesmo enfrentando uma crise crescente por falta de recursos, a rede federal realizou 45 mil cirurgias e 850 mil consultas em 2023. Cobrou do governo a abertura de uma mesa de negociação para debater as reivindicações da greve.
O presidente do Conselho Municipal de Saúde, Osvaldo Sérgio Mendes, criticou o Ministério da Saúde por ter imposto o projeto sem consulta ao controle social. “Esta postura não combina com um governo que se diz democrático. Queremos ser ouvidos e somos contra o fatiamento, a municipalização e a privatização dos hospitais federais”, disse.
Argumentos do MS – Os representantes do Ministério da Saúde, Valcler Rangel, assessor da ministra Nísia, e Nilton Pereira, secretário de Atenção Especializada, logo no início dos debates, e antes, portanto, da votação contra a municipalização, tentaram colocar a responsabilidade da crise ano modelo de gestão e não na falta de recursos. “Vemos crises que se repetem ao longo dos anos. Eu sei que vocês talvez não gostem do termo, mas a gestão destes importantes hospitais tem que se modernizar”, tentou defender Valcler, sendo muito vaiado.
Chamou o desmembramento, municipalização e entrega das seis unidades federais à Ebserh, Fiocruz e grupo Conceição, de descentralização e reestruturação. “E para tocar esta reestruturação, para fazer estas mudanças, contamos à frente do DGH (Departamento de Gestão Hospitalar), da médica Teresa Navarro, que trabalhou no Hospital do Andaraí, e foi subsecretária municipal de saúde”, afirmou. Esqueceu de dizer que foi ao lado do secretário Daniel Soranz, que Navarro ajudou privatizar toda a rede própria da Prefeitura do Rio, entregando-a nas mãos das chamadas organizações sociais, que nada mais são que fachada de grupos privados.
E agora Nísia? – Nilton Pereira fez uma longa explanação, com gráficos, tabelas e números diversos mostrando o tamanho da crise, com falta de todo tipo de insumo, déficit crescente de profissionais; lembrando que contratos temporários vêm sendo prorrogados por falta de concurso. Mas não apontou como solução a retomada de investimentos públicos, nem a realização de concurso. Disse, porém, que levantamento feito pelo MS apontou a existência de irregularidades.
“Isso (a ampliação das crises na rede federal) vem se repetindo de tempos em tempos e necessita de uma resposta que é a reestruturação. Esta é a decisão do presidente Lula que a ministra Nísia está encaminhando. Estamos iniciando este processo de transição, que começa com a municipalização do Hospital do Andaraí”, disse, sem explicar o que faria o governo se também o Conselho Estadual de Saúde rejeitasse o projeto de fatiamento e municipalização, o que acabou acontecendo pouco depois.