Com a participação dos agentes de combate a endemias originários da Fundação Nacional de Saúde (Funasa) e guardas de endemia, servidores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e dirigentes de diversos sindicatos, entre eles o Sindsprev/RJ e a Associação de Funcionários da Fiocruz (Asfoc), foi realizado na última quinta-feira (2/5), ato público em frente ao Centro de Estudos da Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana (Cesteh) da Fiocruz em Manguinhos. A manifestação foi em memória das vítimas de acidentes de trabalho, entre eles, os guardas e agentes de combate a endemias, os trabalhadores da Vale do Rio Doce mortos na tragédia de Brumadinho (MG), e contra a Proposta de Emenda Constitucional (PEC nº 6) do governo Bolsonaro, que estabelece a reforma da Previdência Social.
Todos os que discursaram durante o ato lembraram da importância dos atos unificados convocados pelas centrais sindicais no Dia do Trabalhador contra a reforma e da necessidade de preparar a greve geral do dia 14 de junho. Enfatizaram ser preciso unidade para evitar o que classificaram como o maior ataque aos direitos previdenciários da história do país. Ébio Wilian, do Departamento de Saúde do Trabalhador do Sindsprev/RJ, defendeu uma resposta à altura do golpe que significa a reforma. E, no caso dos agentes de combate a endemias, cobrou o fim da utilização de inseticidas, que são cancerígenos, o respeito ao uso de equipamentos de proteção individual e a realização de exames de saúde periódicos. Para o dirigente é necessário a substituição destes produtos por um trabalho de conscientização da população sobre como combater doenças como a dengue.
Banimento
Ariane Laurentis, pesquisadora do Cesteh da Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP), defendeu durante o ato e em debate pouco antes sobre os mesmos temas da manifestação, uma campanha pelo banimento do malathion (malationa) amplamente utilizado pelos mata-mosquitos por ordem do Ministério da Saúde com efeitos perversos para a saúde destes trabalhadores e da própria população. O produto é cancerígeno. “É urgente banir a malationa do país e acompanhar a saúde dos trabalhadores expostos e contaminados”, defendeu.
Em conjunto com o Sindsprev/RJ, o Sintrasef/RJ e o Sintsaúde/RJ, o Cesteh vem realizando pesquisa sobre as mortes e adoecimento dos agentes de combate a endemias. Foi possível constatar que entre 2013 e 2017 ocorreram 75 óbitos. Grande parte destes trabalhadores morreram em idade produtiva (55 anos), sendo 26,7% entre 41 e 49 anos, 40% entre 50 e 59 anos e 25% entre 60 e 69 anos. “Em comparação com a expectativa de vida no Brasil de 76 anos (IBGE, 2017), isso evidencia a precocidade das mortes, reduzindo em pelo menos 20 anos o seu tempo de vida, tornando incompatível com a atual proposta de aumentar a idade mínima para a aposentadoria no Brasil”, argumentou.
As principais causas das mortes precoces são doenças do aparelho circulatório (38,7%) e câncer (14,7%), semelhante aos dados do Sistema de Informações de Mortalidade Brasileiro (2016). Dados mundiais da Organização Panamericana de Saúde/OMS mostram que a primeira causa de morte também são as doenças cardiovasculares, mas o câncer é a sexta causa de morte no mundo.
Para a pesquisadora da Fiocruz estes dados mostram a situação estarrecedora destes trabalhadores expostos a produtos químicos cancerígenos, entre eles, o mais maléfico, a malationa. “Por isto defendemos que esta substância seja banida”, defendeu.
Sem proteção
Ébio enfatizou no debate que há cerca de 30 mil agentes de endemias trabalhando ligados às prefeituras fluminenses sem qualquer política de proteção à saúde. “Não passam pelo exame mensal obrigatório, nem pelo exame periódico e não têm EPIs. E isso tudo, estando expostos a uma grande quantidade de inseticidas e suas graves consequências para a nossa saúde, inclusive levando inúmeros companheiros à morte”, denunciou. Defendeu a necessidade de mudança no processo de trabalho. “As mortes estão relacionadas ao processo de trabalho”, comentou a diretora do Sintsaúde, Luiza Dantas. Lembrou que existem alternativas aos produtos químicos como a esterilização química dos mosquitos transmissores, e outras. Acrescentou que o uso de inseticidas faz parte da política que está sendo adotada pelo país de permissão de produtos químicos, como agrotóxicos, proibidos no resto do mundo. “A existência desta política é o grande empecilho para a mudança do processo de trabalho dos ACEs”, argumentou. A diretora do Sintrasef/RJ, Maria do Socorro, lembrou que o Parkinson é outra doença que tem atingido os agentes e guardas de endemia por conta do uso de produtos químicos.
Reforma da Previdência
Na palestra, no auditório Internaciona Constituição Federal e normas internacionais relativas a direito previdenciário e de idosos. Citou a Convenção Americana de Direitos Humanos, segundo a quorma da Previdência que contraria a Constituição Federal e normas internacionais relativas a direito previdenciário e de idosos. Citou a Convenção Americana de Direitos Humanos, segundo a qual problemas econômicos dos países membros não podem servir de justificativa para violar direitos da seguridade social.
Questionou o comportamento do governo Bolsonaro de não divulgar os números oficiais que justificariam a reforma da Previdência. “Não há transparência nem vontade política para discutir esta questão com a sociedade, o que soa muito estranho, ainda mais quando o discurso oficial fala na existência de um déficit previdenciário que não há”, afirmou.
Para Thales o objetivo da reforma é reduzir drasticamente o custeio para quebrar a Previdência Social pública, de modo a beneficiar os bancos. “A reforma vai falir a Previdência para que um setor não produtivo lucre mais ainda com isto”, avaliou, acrescentando que já está havendo uma progressiva redução do tamanho da Previdência, através da cada vez menor concessão de benefícios, em função de mudanças em normas internas da instituição e das leis. “É cada vez mais difícil conseguir aposentadoria por invalidez e auxílio doença, por exemplo. Com isto é possível afirmar que a reforma da Previdência já está em curso. A alta programada e as mudanças impostas pela reforma trabalhista, como o trabalho intermitente, são exemplos disto”, lembrou.
Listou como principais pontos negativos da reforma o aumento do tempo exigido para se aposentar, através da fixação de idade mínima de 65 anos para homem e de 62 para mulheres, só recebendo o valor integral caso contribua por 40 anos; o aumento de 15 para 25 anos do tempo mínimo de contribuição para ter direito a se aposentar; a redução pela metade da pensão em caso de morte do cônjuge aposentado; a proibição da acumulação de pensão e aposentadoria; a redução para menos de um salário mínimo do Benefício de Prestação Continuada (BPC) pago a pessoas que vivem na linha da miséria; a desvinculação do LOAS do salário mínimo; e a fixação do teto do Regime Geral da Previdência Social para os servidores públicos.
Classificou o sistema de capitalização, pelo qual somente o trabalhador contribuiria para um fundo administrado por bancos que pagaria futuramente a aposentadoria, como “natimorto”. “O Paulo Guedes (ministro da Economia), fala em economizar R$ 1 trilhão com a reforma. Vai precisar destes recursos para o fundo de capitalização que, depois de algum tempo, não vai ter como bancar as aposentadorias, como aconteceu no Chile, cujo sistema que Guedes também ajudou a criar, durante a ditadura de Pinochet, agora faliu, depois de pagar aos trabalhadores aposentadorias cada vez menores”, frisou. “O crescimento da concessão de cada vez mais aposentadorias aumenta o custo do fundo levando-o à falência”, avaliou.
Lembrou que a Previdência é um dos maiores distribuidores de renda no país e que permite à população mais carente permanecer nas cidades do interior quando se aposenta. “A reforma, se for aprovada, vai aumentar o êxodo rural, impactando negativamente as grandes cidades”, previu. Para Thales, a solução seria fortalecer o caixa da Previdência com a criação de novas fontes de custeio para setores em que há intensa concentração de recursos e utilização reduzida de mão de obra. “Como exemplo, setores produtivos que pouco geram empregos em função da intensa mecanização e que favorecem por si só a concentração de renda, promovendo a desigualdade social”, exemplificou. Citou ainda como fontes de custeio o imposto sobre grandes fortunas, sobre lucros e dividendos, sobre a produção de aeronaves, além da majoração de tributação sobre heranças.