A criação de uma fila única para o atendimento de pacientes de covid-19 em hospitais públicos e privados é uma proposta que vem ganhando cada vez mais corpo entre fóruns de saúde, sindicatos, conselhos profissionais, conselhos gestores e entidades representativas do SUS. Na semana passada, o médico sanitarista Gonzalo Vecina Neto defendeu a proposta da fila única. Para ele, se a fila única não for adotada, “brasileiros pobres vão morrer e brasileiros ricos vão se salvar”.
Debatida no início de abril por grupos de estudo da USP e UFRJ, a proposta ganhou corpo no interior do próprio Conselho Nacional de Saúde, que enviou ao ministro Nelson Teich e aos secretários estaduais de saúde uma recomendação para que assumam a coordenação da alocação dos recursos assistenciais existentes, incluindo leitos hospitalares de propriedade de particulares, requisitando seu uso quando necessário e regulando o acesso segundo as prioridades sanitárias de cada caso.
Atualmente, a rede privada possui 15.898 leitos de UTIs, com ociosidade de 50%, enquanto a rede pública de saúde tem 14.
876 e está à beira de um colapso. A informação sobre a ociosidade dos leitos no sistema privado é da própria Federação Brasileira de Hospitais, que reúne 4.200 instituições privadas de saúde.
A proposta de fila única em debate no Conselho Nacional de Saúde e em outros fóruns prevê que a fila seja permanentemente atualizada e regulada pelo SUS, nos mesmos moldes das filas de transplantes, constituídas unicamente a partir de critérios de gravidade do quadro clínico, e a partir da condição social e econômica dos pacientes. O objetivo é garantir tratamento universal e igualitário dos casos graves da covid-19.
Não é por acaso que a proposta de fila única vem sendo duramente combatida pelas empresas e planos privados de saúde, que não querem arcar com nenhum custo adicional pelo atendimento de pacientes da covid-19 ou de outras patologias. Para eles, saúde é uma mercadoria a ser disponibilizada tão somente aos que por ela podem pagar.
Apesar de concordar com o princípio geral contido na proposta de fila única, o servidor Sebastião José de Souza (Tão), dirigente do Sindsprev/RJ, manifesta o temor de que o atendimento sofra interferências ou deformações provocadas pelo poder econômico. “Que garantia temos de que pessoas mais abastadas não vão passar na frente de outros pacientes com menos recursos ou oriundos de comunidades pobres?
Os critérios terão que ser totalmente objetivos e transparentes, mas será que um paciente morador de favela vai ser efetivamente atendido num hospital privado, caso necessite? Será que ele vai ser bem atendido?”, questiona.
Esta semana, uma carta da União dos Fóruns de Luta de Niterói propôs um conjunto de medidas para o enfrentamento da grave pandemia de covid-19, entre elas a adoção da fila única. No documento, o Fórum afirma que “leitos de internação e de UTI da rede pública e privada devem ser ocupados nestes tempos de pandemia de acordo com a demanda organizada em fila única no SUS, conforme recomenda o Conselho Nacional de Saúde”.