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sábado, novembro 23, 2024
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Em defesa do direito à aposentadoria e contra a reforma da Previdência (PEC nº 06), que retira direitos históricos dos trabalhadores.

Realizada de 24 a 26 de maio, no Teatro Odylo Costa Filho (Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ), a 8ª Conferência Estadual de Saúde do Rio de Janeiro foi marcada por duras críticas à Emenda Constitucional nº 95 — que congela os orçamentos públicos por 20 anos — e ao desmonte da seguridade social promovido pelo governo Bolsonaro em nível nacional. A Conferência também reafirmou a defesa dos princípios gerais que norteiam o Sistema Único de Saúde (SUS), como a base de financiamento público para garantia de uma saúde pública, gratuita e universal para toda a população.

Na plenária de domingo (26/5), esses princípios foram reafirmados para as diretrizes nacionais aprovadas ao final da Conferência. Mas infelizmente, por falta de organização, a Conferência não pôde ser concluída, o que impediu que fossem votadas as diretrizes estaduais. Em razão disto, a comissão organizadora vai convocar uma plenária estadual em até 60 dias, para que as diretrizes estaduais e demais pendências da Conferência sejam efetivamente votadas. “A organização da conferência não conseguiu dar o mínimo de organização ao evento e ninguém sabia nem mesmo como fazer o credenciamento de delegados. Apesar dos bons debates realizados, a plenária ficou prejudicada por conta do tempo de apenas 2 minutos para as falas. A organização dos grupos de trabalho, fundamental para discutir políticas de saúde, também foi ruim porque embaralhou e misturou os assuntos debatidos nos eixos temáticos, fracionando as discussões. Outro retrocesso foi que apenas mil conselheiros vão participar da próxima Conferência Nacional de Saúde, quando no passado já tivemos conferências nacionais com até 8 mil conselheiros”, criticou Osvaldo Sergio Mendes, diretor do Sindsprev/RJ presente à Conferência Estadual.

Defesa do SUS, da saúde pública e gratuita

Algumas das diretrizes nacionais aprovadas na Conferência foram as que afirmam a ‘saúde como direito à cidadania’; o ‘fortalecimento das instâncias de controle social e participação, em articulação com os movimentos sociais e suas pautas’; e ‘a defesa inequívoca das diretrizes do SUS e das prioridades sanitárias, de forma que o mercado privado de saúde não se sobreponha às necessidades e ao direito à saúde no sistema público’. Outra importante diretriz foi a que ‘exige a revogação de medidas que contribuem para o desmonte do SUS e consequente redução dos aportes financeiros que visam garantir um financiamento estável’.

O início da plenária de domingo foi tenso e marcado por divergências entre setores da plenária e a relatoria das propostas defendidas nos grupos de trabalho. A plenária efetivamente só começou quando foram distribuídos cadernos com o resumo dos debates nos grupos a todos os delegados.

O traço marcante de toda a Conferência, porém, foram as críticas ao desmonte da saúde pública e do conceito de seguridade social promovido pelo governo Bolsonaro. Críticas também foram direcionadas à entrega das gestões da saúde às chamadas ‘organizações sociais’ (O.S.), vistas como privatização disfarçada, e ao Decreto nº 9759, de abril deste ano, que prevê a extinção, a partir de 28 de junho, de colegiados da administração pública federal direta, autárquica e fundacional, incluindo grupos como comitês e comissões. O Decreto é visto como uma ameaça ao controle social na saúde pública e ao Conselho Nacional de Saúde.

Todas as propostas de diretrizes serão enviadas à 16ª Conferência Nacional de Saúde, que acontecerá em agosto deste ano.

Protestos da saúde estadual na abertura

A cerimônia de abertura da 8ª Conferência, na sexta-feira 24, foi iniciada com a fala da presidente do Conselho Estadual de Saúde, Zaira da Costa, que agradeceu ao Sindsprev/RJ, ao SintSaúde e à Secretaria Estadual de Saúde pelo apoio ao evento. Mas as demais intervenções foram marcadas por protestos de servidores da saúde estadual, que cobraram promessa do governador Wilson Witzel de implementar o Plano de Cargos e Remuneração (PCR) da categoria, lembrando que a Lei 7946/18 manda implementar o plano, o que é uma decisão política do atual governador. Os servidores também distribuíram panfleto denunciando o sucateamento e o desabastecimento das unidades da rede estadual e uma moção de repúdio à política de segurança do governador Witzel. Ao final do protesto, abriram uma faixa na qual se lia a frase: ‘saúde não é mercadoria’.

Presente à cerimônia, o secretário estadual de saúde, Edmar Santos, foi evasivo sobre a implementação do PCR, após ser cobrado por servidores, dizendo apenas que ‘continuará o diálogo com os trabalhadores’.

Representante dos trabalhadores, a deputada enfermeira Rejane (PCdoB) destacou a importância da Conferência. “É mesmo um desafio fazer a 8ª Conferência num momento muito difícil do país, no qual uma reforma da previdência ataca direitos de trabalhadores, idosos e mulheres. Temos que lutar para que os nossos direitos se mantenham, para que o controle social garanta a equidade no SUS. Na saúde estadual os trabalhadores lutam há mais de 20 anos pelo seu plano de carreira e na saúde temos organizações sociais [O.S.] praticando uma gestão privada, enganando a população”, disse, sob aplausos.

‘Ameaças ao SUS são reais’, dizem servidores

Na plenária de sábado (25) pela manhã, os debatedores destacaram os eixos principais de críticas, sobretudo de usuários e profissionais de saúde, ao que consideram ameaças concretas ao SUS. Algumas das ameaças citadas foram a continuidade da participação de O.S., fundações de direito privado e Ebserh na gestão de unidades públicas de saúde; a privatização da saúde e as perdas de direitos dos trabalhadores do setor.

Outro elemento destacado foi o da necessidade de responder à sistemática propaganda que busca demonizar a gestão pública da saúde e o controle social, apresentando o capital privado como portador de ‘virtudes’ administrativas ou como ‘solução’ para os problemas da saúde.

“Sem dúvida que a revogação da Emenda 95 é fundamental para garantirmos mais recursos e assim darmos conta das demandas da saúde, mas que não seja uma saúde curativa, e sim preventiva, com uma visão ampliada, que possa garantir direitos e, o que é fundamental, com gestão pública dos serviços de saúde. É assim que vamos fortalecer a universalidade e os interesses públicos no SUS”, afirmou a conselheira nacional de saúde Elaine Pelaez, para em seguida reforçar: “a atuação nos conselhos e conferências é importante, mas é nas lutas, nas ruas e mobilizações, como fizeram os estudantes e trabalhadores da educação no dia 15 de maio, que vamos reverter essa situação”.

Governo Bolsonaro mantém desmonte da PNAB

Ex-conselheiro municipal e estadual de saúde, o servidor Nereu Lopes também reafirmou a necessidade da luta para reverter os ataques ao SUS. “Minha expectativa é que o controle social se una para combater as três esferas de governo que no momento estão cortando todos os nossos direitos. Eu consegui me aposentar, mas não sei se muitos companheiros vão conseguir o mesmo por causa da reforma da previdência. A saúde, a assistência social e a previdência, que forma o tripé da seguridade social, nunca estiveram tão ameaçadas como agora. Não podemos perder nossas conquistas”, disse.

Tanto as intervenções da mesa quanto do plenário criticaram duramente o governo Bolsonaro, tido como portador de políticas restritivas que se afastam dos objetivos e mecanismos da atenção básica previstos no SUS. Um exemplo citado foi a Política Nacional de Atenção Básica (PNAB), pactuada no governo Temer sem a participação do controle social e continuada sob o atual governo. PNAB que restringiu e reduziu o número de ACS nas equipes de saúde da família, entre outros ataques à saúde pública.

“Os problemas da Política Nacional de Atenção Básica são graves. Em algumas clínicas da família só há ACS pra atender 2 mil famílias cadastradas, o que nos gera doença e a perspectiva de não dar conta desse atendimento. Queremos lutar contra toda essa precariedade em nível nacional e estadual. Por isso estamos aqui na Conferência”, explicou Alcineia de Lima, agente comunitária de saúde (ACS) do município de Duque de Caxias.

Políticas específicas no SUS

Delegada que veio à 8ª Conferência representando o segmento dos usuários, Viviane Iório Antã da Silva participa do grupo chamado ‘Mães Pâncreas’, de mães de crianças diabéticas. Ela falou dos problemas enfrentados por esses pacientes. “Lá no meu município, Duque de Caxias, no Hospital Infantil Ismélia, lutamos pelo atendimento de nossos filhos, pelo fornecimento de medicamentos e insumos, o que para eles é vida. Muitos insumos não chegam com regularidade, à exceção da fita de medição de glicose. Queremos que haja distribuição, regularidade e acesso. E achamos que este também é um assunto da Conferência”, frisou.

Servidor da saúde lotado em Nilópolis, José Augusto da Silva destacou o financiamento da saúde como fundamental. “Estamos tentando reverter o desmonte do SUS, mostrando à população que precisamos nos unir para isto, como também é fundamental nos unirmos para garantir o financiamento básico da saúde. As conferências propõem diretrizes, mas não têm o poder de transformar em lei as suas resoluções. Por isso é tão importante a mobilização dos usuários”.

“A conferência estadual expressou as reivindicações dos mais de 90 municípios que fizeram suas conferências com propostas para a melhoria dos serviços de saúde. Na maioria dos municípios, infelizmente, faltam recursos humanos como médicos, enfermeiros, dentistas, psicólogos e vários outros profissionais, além de leitos. Me preocupo se vamos conseguir implementar todas as propostas discutidas aqui, pois o ministro da saúde fala na extinção do SUS e na valorização dos planos de saúde privados, o que poderá deixar milhões de pessoas sem atendimento”, resumiu a servidora Maria Celina de Oliveira, dirigente da Regional Norte do Sindsprev/RJ.

A 8ª Conferência foi realizada com base na paridade, sendo 50% dos delegados oriundos do seguimento usuário e os outros 50% divididos entre profissionais de saúde e gestores. O tema da 8ª Conferência foi “Democracia e Saúde: Saúde como Direito e Consolidação e Financiamento do SUS”.

Os debates realizados nas mesas da 8ª Conferência foram divididos em 3 (três) eixos: Eixo 1 (Saúde como direito); Eixo 2 (Consolidação dos princípios do SUS); e Eixo 3 (Financiamento adequado e suficiente para o SUS). A 8ª Conferência teve 600 delegados e delegadas, oriundos de mais de 80 municípios fluminenses.

Protesto dos servidores da saúde estadual, durante a Conferência

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