22.3 C
Rio de Janeiro
quinta-feira, novembro 21, 2024
spot_img

Representantes de bancos citados em inquérito são levados por Guedes para o Ministério da Economia

Representantes de empresas e bancos de investimentos participantes em operações investigadas em dois inquéritos da Força Tarefa Gereenfield, da Procuradoria da República do Distrito Federal, foram levados por Paulo Guedes, alvo central das apurações, para o Ministério da Economia. Entre estas empresas e bancos, todos interligados nas transações lideradas por Guedes, estão os bancos Plural e Modal, a Bozano Investimentos e o Banco Internacional do Funchal (Banif Brasil), além da Bradesco Asset Managemernt.

Da Bozano Investimentos, veio o próprio Paulo Guedes, seu ex-presidente. A empresa é formada pela BR Investimentos, Mercatto Asset e a Trapezus, tendo ainda como sócio minoritário, Júlio Bozano, fundador do Banco Bozano, Simonsen. Guedes foi, como se sabe, um dos fundadores do BTG-Pactual. Após sua ida para o Ministério da Economia, em janeiro de 2019, a Bozano passou a chamar-se Crescera, com foco em investimentos em private equity (compra de parte de empresas consolidadas, para futura abertura de capital, com ganhos através de venda posterior). O restante dos negócios da Bozano, passou para a XP Investimentos CCTVM S/A, que é citada nos inquéritos, com seu nome antigo, Americainvest CCTVM Participações Ltda (o primeiro inquérito da Força Tarefa Greenfield sobre Guedes investiga transações de 2009 a 2013).

Outra investigada no mesmo inquérito é a assessora especial de Assuntos Estratégicos do Ministério da Economia, Daniella Marques Consentino, ex-diretora da Mercatto S2 Participações. A empresa pertence também à teia societária da Bozano Investimentos, hoje Crescera Investimentos, da qual Guedes era sócio.

Presidente da Caixa

Do Plural, também citado nos inquéritos – após ser sócio do BTG-Pactual – veio o atual presidente da Caixa Econômica Federal, Pedro Guimarães, genro do ex-presidente da empreiteira OAS, Léo Pinheiro, preso na Lava-Jato. O presidente do Banco Plural é Rodolfo Riechert, citado pelo delator Lúcio Funaro, em operações envolvendo o Fundo Garantidor de Crédito (FGC – cuja finalidade é buscar preservar o patrimônio do investidor, ou parte dele, caso a instituição financeira venha a falir). Funaro era operador de Eduardo Cunha e Joesley Batista (JBS) e é também testemunha arrolada no inquérito da Força Tarefa Greenfield que investiga Paulo Guedes.

Muitos executivos do Plural trabalharam no BTG-Pactual. Alguns, como Claudio Pracownik, foram do Santander, banco espanhol do qual foi vice-presidente. Pracownik foi também diretor e membro do comitê executivo do banco Bozano, Simonsen. O atual presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, também foi diretor do Banco Bozano, Simonsen e do Santander. É importante lembrar que ambos os bancos – principalmente o Bozano – participaram de diversas privatizações, entre elas, de bancos estaduais. São especialistas no assunto. O Bozano foi quem preparou a venda do Banerj ao Itaú e o Santander comprou o Banespa.

Modal e Bradesco de Levy

O Banco Modal também aparece no inquérito da Operação Greenfield. Seu presidente, Eduardo Centola, entusiasta da candidatura Bolsonaro e membro da equipe de transição de Paulo Guedes, foi cogitado para ser o presidente do BNDES.

Tem estreitas ligações com ambos.

Mas quem acabou empossado no cargo foi Joaquim Levy. Primeiro presidente do BNDES no governo Bolsonaro, Levy foi diretor da Bradesco Asset Management (BRAM), até 2014. A subsidiária do segundo maior banco privado do país, também aparece no inquérito da Operação Greenfield. Prestou um serviço de amigo a Paulo Guedes em 2013: a BRAM assinou contrato com os fundos de pensão de estatais de maneira provisória, até que a BR Educacional Gestora de Recursos S/A – da BR Investimentos, uma das empresas da Bozano Investimentos – de Guedes, que ainda não tinha existência legal, o fizesse.
Levy ficou na Presidência do BNDES por meses até ser substituído por Gustavo Montezano, que também foi diretor do BTG-Pactual, como Guedes. Outro que foi do BTG-Pactual é o presidente do Conselho de Administração do BNDES, Marcelo Serfaty.

Transação faliu Banif

O Banco Internacional do Funchal no Brasil (Banif Brasil) entrou como boi de piranha nas transações investigadas de Paulo Guedes que eram um verdadeiro cipoal de CNPJs. De origem portuguesa o Banif fechou contrato com sete fundos de pensão, para investir recursos de mais de R$ 1 bilhão. Contratou para realizar de fato os negócios o Fundo de Investimentos Brasil de Governança Corporativa Multiestratégia (FIP BGC), que tinha como cotista a BR Educacional de Guedes (da Bozano Investimentos), e o FIP Caixa Modal Óleo e Gás Investimentos em Participações (do Modal).

As operações acabaram por causar prejuízos aos fundos de pensão e outros clientes que passaram a cobrar do Banif indenizações pelas perdas milionárias. O banco foi incorporado pelo BTG em 2016 sendo posteriormente liquidado, mesmo após receber aportes públicos portugueses. O administrador do banco António Varela, indicado pelo governo de Portugal, em 2016, disse que as operações do Brasil eram desastrosas.

“Não se tratava de má gestão ou simples incompetência. Havia todas as indicações de que se tratavam de atos criminosos”, disse. O Banif chegou a ser citado em algumas investigações da Lava Jato. Um dos pagamentos feitos a Renato Duque, ex-executivo da Petrobrás, teria saído de uma conta do Banif. O braço brasileiro (Banif Brasil) teria gerado, entre 2012 e 2015, perdas de 267 milhões de euros.

O que investigam os inquéritos

Os dois inquéritos instaurados pelos Procuradores de República de Brasília da Força Tarefa Greenfield, Sara Moreira de Souza Leite e Anselmo Henrique Cordeiro Lopes, apuram a participação de empresas de propriedade do então empresário Paulo Roberto Nunes Guedes, sobretudo a BR Educacional Gestora de Recursos S/A por crimes de gestão fraudulenta ou temerária e emissão e negociação de títulos mobiliários sem lastro ou garantias através de aplicações feitas pelo Fundo de Investimentos (FIP) BR Educacional e Fundo Brasil de Governança Corporativa. As transações causaram prejuízos bilionários aos fundos de pensão de empregados de estatais.

Os inquéritos passaram a correr em sigilo desde que em 1º de janeiro de 2019 Guedes se tornou ministro.

O primeiro deles – instaurado em 2016 – investiga operações feitas entre 2009 e 2013 comandadas por Paulo Guedes, em investimentos em empresas do setor de educação privada, com recursos dos fundos de pensão. No curso destes levantamentos, os procuradores tiveram que abrir um novo inquérito, este já em 2018, ao encontrar novos e fortes indícios de gestão fraudulenta ou temerária de recursos de fundos de pensão, através do Fundo de Investimentos Brasil de Governança Corporativa Multiestratégia (FIP BGC), que tinha como cotista a BR Educacional de Guedes e o FIP Caixa Modal Óleo e Gás Investimentos em Participações (do Banco Modal).

Prejuízos milionários

O primeiro inquérito mostra que a BR Educacional cobrou taxas de administração e de performance do investimento consideradas pelos procuradores como abusivas, com o artifício de serem calculadas sobre o capital subscrito e não sobre o capital investido, como deveria ser. O prejuízo decorrente foi de mais de R$ 152 milhões, a valores de 2018. Os procuradores suspeitam que Guedes abocanhou ainda mais recursos, pois aparecia, ao mesmo tempo, como presidente da BR Educacional, como conselheiro da Ânima Holding S/A e da BR Educação Executiva S/A (recebedoras dos investimentos). Aponta, ainda, conflito de interesses, já que Guedes obteve os recursos dos fundos de pensão, era proprietário das empresas gestoras dos fundos responsáveis por investir o dinheiro e presidente e conselheiro de administração das empresas que receberam os investimentos.

Outro indício de ilegalidade foi o ágio na compra de ações da empresa Gaec Educação, pelo FIP BR Educacional, ou por permuta por ações da BR Educacional: em março de 2013 uma ação valia R$ 51, em abril foi comprada pelo FIP por R$ 217 e via permuta por R$ 570. Os procuradores descobriram que a contratação da BR Educacional foi feita às cegas pelos fundos de pensão, já que não havia menção das empresas-alvo dos investimentos, indício de uma relação espúria entre as partes contratantes. Reforça esta tese a assinatura de contrato provisório entre a Bradesco Asset Management e os fundos de pensão, até que a BR Educacional recebesse autorização para funcionar da Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

Trambiques

A partir da constatação de mais indícios da participação de Paulo Guedes em gestão fraudulenta ou temerária com dinheiro de sete fundos de pensão, os procuradores da Força Tarefa Greenfield foram obrigados a instaurar um novo inquérito. Guedes procurava não aparecer na transação. Os investimentos, de mais de R$ 1 bilhão, foram feitos através do Fundo de Investimentos e Participações Brasil de Governança Corporativa Multiestratégia (FIP BGC) e do FIP Caixa Modal Óleo e Gás Investimentos em Participações. Guedes era não apenas a ligação entre as operações investigadas nos dois inquéritos, como comandou ambas, através da BR Educacional Gestora de Recursos S/A (da BR Investimentos, depois Bozano Investimentos). No segundo caso, a gestora era cotista do FIP BGC.

O FIP BGC captou dos fundos de pensão (entre outros a Previ, do Banco do Brasil, Funcef, da Caixa Econômica Federal, Fapes, do BNDES) R$ 600 milhões para investir nas empresas Enesa Participações S/A, Abril Educação, Hortigil Hortifruti, Newpark Participações e Alpark S/A. Já o FIP Óleo e Gás investiu R$ 500 milhões dos mesmos fundos de pensão também na Enesa Participações, e na Embraequip e na Georadar. Os mais de R$ 200 milhões aplicados na Enesa, pelos dois FIPs, no entanto, viraram pó. Segundo os procuradores, a empresa tinha patrimônio negativo. Em valores de outubro de 2018, essa perda total do investimento chegou a um montante superior a R$ 719 milhões. Segundo a Forã Tarefa Greenfield, não houve análise de risco do investimento.

Outra fraude verificada foi a de que em datas próximas à entrada, via FIPs (Brasil Governança Corporativa e Modal Óleo e Gás), dos recursos dos fundos de pensão na Enesa Participações S/A (5 de maio de 2010) houve distribuição de dividendos de R$ 77 milhões, caracterizando saída de recursos.

Empresas fantasmas

Outra grave fraude era a existência entre as sete empresas em que a Enesa Participações aparecia como sócia, de apenas duas em efetivo funcionamento: a Enesa Engenharia Ltda e a Brasil Lau-Rent Locação de Equipamentos Ltda. As demais, os procuradores suspeitaram serem de fachada, devido ao baixo capital social apresentado: respectivamente R$ 100, R$ 500, R$ 1 mil, R$ 10 mil e R$ 50 mil. Levantamento da PricewaterhouseCoopers mostrou que não tinham atividade operacional a Enesa Óleo e Gás, a Enesa Comércio e Serviços e a Enesa Investimentos e Infra-Estrutura S/A, existindo só no papel.

Apesar disto, esta última registrou em 13 de agosto de 2018, aumento de capital: de R$ 100 para mais de R$ 327 milhões. O que levou à suspeita de ser um desvio do dinheiro dos fundos de pensão que teria sido perdido na Enesa anteriormente. E mais: os procuradores descobriram que em 24 de agosto daquele ano, a Enesa Investimentos S/A foi transformada em Ltda, quando o que geralmente acontece é o caminho oposto.

Mais à frente encontraram novos indícios de fraudes e desvios do dinheiro. Descobriram que, antes do aumento de capital, os gestores do FIP Brasil Governança Corporativa e FIP Modal Óleo e Gás venderam 100% das cotas dos respectivos fundos a Sérgio Ferreira Laurentys, dono da Holding Enesa em 1º de agosto de 2018, respectivamente por R$ 100 mil e R$ 77 mil. Na negociata, o FIP Brasil Governança Corporativa foi representado pela Bozano Venture Partners Ltda (incorporação da BR Educacional Gestora de Recursos S/A pela Bozano Investimentos, de Paulo Guedes) e o FIP da Modal Óleo e Gás (do Banco Modal) pela Brasil Plural Gestão de Produtos Estruturados (do Banco Plural).

Outra comprovação de que teria havido conluio e fraude com os recursos foi que a avaliação da PreciwaterhouseCoopers que mostrou ser negativo o patrimônio da Enesa Participações S/A só foi feito em 27 de março de 2018, portanto, um mês após a venda das cotas à Holding Enesa. A venda, aliás, só foi aprovada pelos cotistas dos FIPs, ou seja, os fundos de pensão das estatais, em 11 de maio de 2018, ou seja, três meses após a venda.

Os procuradores descobriram, ainda, que a Enesa Invesimentos em Infra-Estrutura não constava como integrante da Holding Enesa, nos registros da Junta Comercial de São Paulo. Nestes registros não consta, ainda, a realização de assembleia de acionistas para o aumento de capital. E mais: quando foi alterada a natureza jurídica de S/A para Ltda foram registrados como ‘sócios’ da Enesa Investimentos em Infra-Estrutura a Enesa Participações S/A, com capital de mais de R$ 327 milhões e a SHLM com cerca de R$ 32 mil. Ambas têm o mesmo endereço e como diretor-presidente Sérgio Ferreira de Laurentys.

Cheque em branco

Na visão dos procuradores, a ausência de análise de risco do investimento e da citação das empresas-alvo da aplicação dos recursos foi vista como um cheque em branco em favor da gestora, o Banco Internacional do Funchal (Banif Brasil) ao início da decisão de investimento, que passou depois para a BR Educacional Gestora de Recursos S/A de Guedes. Os procuradores determinaram que fossem tomados depoimentos dos representantes dos fundos de pensão, do Banif, da BR Educacional, da Modal Administradora de Recursos Ltda e da Brasil Plural Gestão de Recursos Ltda.

No despacho de abertura dos inquéritos, solicitaram que a Secretaria da Receita Federal informasse se Paulo Guedes e o irmão Gustavo Nunes Guedes (sócio minoritário da BR Educacional) promoveram repatriação de recursos do exterior, segundo o Regime Especial de Regularização Cambial e Tributária. E que, em caso positivo, promovesse quebra do sigilo bancário e fiscal dos dois.
E convocaram para depor: Paulo Roberto Nunes Guedes, Sérgio Ferreira de Laurentys, Gustavo Henrique Nunes Guedes, Daniella Marques Consentino e o colaborador do Ministério Público, Lúcio Bolonha Funaro. Determinaram que deveria ser dada publicidade e divulgação aos fatos narrados. Mas Guedes não foi ao depoimento, marcado para 6 de novembro de 2018. Empossado em janeiro de 2019 como ministro, o inquérito passou a ser sigiloso. Os gestores dos fundos de pensão foram denunciados. Mas Guedes, ainda não.

NOticias Relacionadas

- Advertisement -spot_img

Noticias